Uma janela aberta para o mundo


No desafio complexo da comunicação, este blogue pretende ser um observatório do quotidiano de uma aldeia do Barrocal Algarvio, inserida no coração da Serra do Caldeirão, acompanhando os ritmos e ciclos da vida em permanente transformação.
Mas também uma janela aberta para a Aldeia Global mediatizada com os seu prodígios e perplexidades.
São bem vind@s tod@s os visitantes que convidamos a deixar o seu contributo, enriquecendo este espaço de encontro(s) e de partilha com testemunhos, críticas e sugestões.OBRIGADO PELA SUA VISITA! SE TIVER GOSTO E DISPONIBILIDADE DEIXE O SEU COMENTÁRIO.

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

FAZEDORES DE IMPOSSÍVEIS OU O PODER DA COOPERAÇÃO


Tive a sorte de adragar o Nuno no Café Barão que me deu devaia enquanto a colava um cartaz alomiando o programa do encontro Maker's Meal. Movido pela curiosidade desloquei-me ao local onde amoravam os artistas e artesãos, que durante doze dias trabalhavam na "mesa ajudada".
Pressenti que algo de extraordinário estava a acontecer no primeiro andar do número um da Rua D. Paio Peres, naquele edifício antigo, com a fachada a acusar as marcas do tempo.
Assomei pelo pórtico de cantaria, atravessei a porta aberta de par em par, subi dezassete caleiras gastas pelos passos de antigos residentes e o escafelo corroído e fui à espreita do que por ali se passava.
Escremalhados no soalho uma teia de cabos eléctricos, aparas de canas, restos de madeiras e aquele cheiro a barro molhado, afagado com devoção pela artista-oleira escocesa Beth Bidwel. Na antiga cozinha,outro artista também escocês Gavin Smith,compenetrado em dar forma a um tronco irregular de medronheiro..Na antiga sala de jantar, o Nuno e a Sofia, orientados pela mestra Filipa Faísca entrelaçam a palma que forma uma pequena trança de empreita , Num canto da sala declaro um jovem que regista atento este cenário com a câmara a espreitar do alto de um tripé, Pousados na mesa para brendicar, doces regionais algumas bebidas,frutos secos, peças de artesanato e alguns objetos pessoais.
Noutra sala troncos retorcidos de oliveira sustentam duas mesas rústicas de pinho, emolduradas de madeira de oliveira, ladeadas por bancos corridos de pinho, com tampo forrado de caniço, trabalho notável do mestre carpinteiro Fernando Henriques. Não resisti a sentar-me para experimentar aquela singular textura de caniço ainda verdejante e olhar com atenção para os artefatos que decoravam as duas mesa, para meu deslumbramento. 
Os pratos, copos e barranhas de barro vidrado em tons claros pareciam querer falar do 
àgape e opiíparo almoço de papas de xerém com sardinhas e do jantar de lentilhas feitas pela mestra Jesus Dias, feitos em caldeirões de latão,curiosa recriação do latoeiro Anolide Carmo.. E as facas, os garfos e as colheres artesanais forjadas pelo  hábil ferreiro,Marco Cristovam.. Duas banastras de cana com fruta da época e outras iguarias, obra do cesteiro Domingos Vaz Costa desafiam olhares e convidam para a festa.E a singularidade daqueles guardanapos improvisados com ramos de mariolas 
...
Esta "Mesa Ajudada" expressão muito feliz porque recupera a tradição das ajudadas, momentos coletivos de entreajuda entre lavradores, foi um daqueles raros acontecimentos em que o sonho generoso foi superado pela realidade, Este interessante projeto inspirado pelo professor-escultor Nuno Sacramento, teve o raro sortilégio de conjugar equilibradamente a teoria e a prática, as tradições populares com saberes académicos e científicos, germinando novas consciências e sensibilidades para uma outra abordagem do desenvolvimento sustentado que respeite o nosso património cultural e ambiental. . De acordo com os testemunhos dos participantes,estes doze dias de trabalho conjunto e cumplicidades, foram momentos inesquecíveis de partilha, cumplicidade e cooperação onde todos se sentiram protagonistas e desenvolveram percursos artísticos pessoalmente gratificantes e socialmente úteis.
É desejável estulizar a continuidade e generalização destas experiências cooperativas, revivendo a utopia de António Sérgio, que acreditava na construção de uma República Cooperativa, onde fosse possível realizar as necessidades individuais e coletivas,  tendo como principal objetivo o desenvolvimento humano, em contraponto com a lógica do Mercado que tem o lucro como primeira preocupação.
E assim se realizaria também a canção de José Afonso Cidade da Utopia.

Cidade
Sem muros nem ameias
Gente igual por dentro
gente igual por fora
Onde a folha da palma
afaga a cantaria
Cidade do homem
Não do lobo mas irmão
Capital da alegria

Joaquim Guerreiro
Um observador participante

Vocabulário algarvio utilizado

adregar- ver, alomiar- anunciar, assomar-espreitar, brendicar-merendar,  caleiras-escadas,  caniço-canas miúdas, declarar- avistar, escremalhadas-espalhadas, escafelo.cafelo caído, estulizar-pensar


Banco com caniço
Prato, copo e talheres


Detalhe
Base de cana


Mesa e bancos




Tacho de latão com colher de puxar
Guardanapo de mariola
Nuno Sacramento





Nuno e Sofia



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