Uma janela aberta para o mundo


No desafio complexo da comunicação, este blogue pretende ser um observatório do quotidiano de uma aldeia do Barrocal Algarvio, inserida no coração da Serra do Caldeirão, acompanhando os ritmos e ciclos da vida em permanente transformação.
Mas também uma janela aberta para a Aldeia Global mediatizada com os seu prodígios e perplexidades.
São bem vind@s tod@s os visitantes que convidamos a deixar o seu contributo, enriquecendo este espaço de encontro(s) e de partilha com testemunhos, críticas e sugestões.OBRIGADO PELA SUA VISITA! SE TIVER GOSTO E DISPONIBILIDADE DEIXE O SEU COMENTÁRIO.

sábado, 31 de outubro de 2020

ATÉ SEMPRE TIA ANTÓNIA BATISTA


Deixou-nos aos 97 anos esta amiga generosa, com uma memória fabulosa e uma longa história de vida de trabalho, testemunho de tempos difíceis de lutas e cansaços.
Dela não falarão os telejornais nem será noticia na comunicação social. Em sua memória partilho uma parte da entrevista que me concedeu no dia 16 de junho de 2019. 
  

A MONDA DO ARROZ, DO TRIGO E A CEIFA NO ALENTEJO

Fui um ano à monda do arroz no Alentejo, perto de Alcácer do Sal. Havia um homem na Tôr, o Armando que arranjava o grupo e fui eu, a minha filha Vitalina com quinze anos e a Tia Teresa Maia. Deixei a Belinha, que devia ter uns três anitos, com a avó, a tia Rosalina. Levámos xerém, grãos e feijão para as refeições e mantas. Íamos com água até aos joelhos, usávamos umas meias altas sem pés para andarmos descalças e íamos em grupo mondar o arroz na lama e dos mosquitos.

Havia sempre uma mulher que fazia o comer para todos em panelas de barro no campo e fogueira a lenha.

À noite dormíamos no chão do armazém, em cima de capachas e embrulhadas nas mantas que levávamos.

Eu já tinha ido com o meu marido à ceifa no Alentejo, e deixei a Vitalina com a avó, mas depois da monda do arroz disse para mim que preferia comer pedras a voltar a ir à monda do arroz e nunca mais fui.

A VIDA ANTIGA ERA MUITO DURA

Trabalhei muito para criar as minhas moças e o meu homem era um moiro de trabalho.

Com as raízes e cepas dos carrascos que arrancava fazia carvoeiras pondo a lenha em covas, ateando fogo e depois cobrindo a lenha a arder com terra.

Ia vender o carvão a Loulé em sacas de abuano no burro, dentro das gorpelhas. Passava pelas Adegas, ia a corta mato, passava à Carronca, atravessava a ribeira, saía aos armazéns da Pardalinha na Cruz da Assumada e em Loulé íamos vender pelas casas. Com o dinheiro que arranjávamos comprávamos batata doce, couves e outros avios.

Criávamos porcos e partíamos de madrugada com uma porca e os filhos, que podiam chegar a oito ou nove numa ninhada. E lá ia eu a pé com a porca e os bacorinhos à frente até ao mercado em Loulé, que ficava fora de Loulé no sítio da Barreira. Vendíamos os porcos que não davam avondo para tanta procura.

O pai do meu homem morreu em França no fundo de uma mina de carvão no norte de França e ele era ainda pequeno e foi a avó que tomou conta dele.

NO TEMPO DO RACIONAMENTO (1940-44)

Uma ocasião encomendei milho de contrabando à tia Mariana das Dores, que morava perto do Lagar. Lembro-me que cheguei lá estava a bater 6 horas no sino da igreja de Salir. Carregámos os meio alqueires de milho nos talegos no canto da gorpelha e lá vinha com medo de ser apanhada.

Noutra ocasião fui comprar farinha no moinho na Cabeça da Areia, a meio da noite, a cavalo do burro, porque era proibido na altura vender farinha. O moleiro veio espreitar com a candeia acesa e lá me vendeu uma saca de farinha e eu vim a pé monte abaixo a baixo, com o burro pela arreata.

O CASAMENTO

No outro tempo faziam uns arcos por cima da rua com biscoitos e flores e os convidados e os noivos passavam por baixo montados nos muares e iam apanhando os biscoitos e comendo.

Jogávamos flores para cima dos noivos quando eles passavam.

Eu estava grávida de sete meses e queria-me casar com o meu homem que vivia com a avó e eu com os meus pais. Fui a Salir no carro de besta do tio Luz, fui-me confessar ao padre “pequenino”, que era da Carrapateira. Ele olhou para mim e disse-me “ó minha filha estás mais que confessada” e mandou-me embora.


A Arte em tempo de Pandemia

 Jacob Krynauw nasceu na África do Sul, especialista nas novas Tecnologias da Informação, durante muitos anos trabalhou como designer gráfico, aposentou-se e veio morar na pacata aldeia  da Nave do Barão onde começou a dar largas à sua fértil imaginação e criatividade.



Para dar visibilidade à sua obra peculiar a Associação "Os Barões" convidou o artista residente para a sua primeira exposição neste tempo ameaçador de crescente ameaça pandémica.



A exposição está programada para decorrer na sede social da associação entre 7 de Novembro e 7 de Dezembro, mas como todos os eventos culturais está sujeita às regras aprovadas pela Direção Geral de Saúde e aguardamos o parecer favorável para dar lugar ao deslumbramento e povoar de arte a "galeria" improvisada no salão de festas dos "Barões". 




terça-feira, 6 de outubro de 2020

AFINAL O INTERIOR "pur si muove"

Nesta luta sempre inacabada e nem sempre conseguida pela defesa do Interior no Concelho de Loulé, muitos têm dado o melhor de si e são escassos os resultados visíveis. Foi com inconformismo e vontade de inverter o destino trágico de morte lenta e desertificação de dois terços do território, que um grupo de duas dezenas de cidadãos vêm fazendo um percurso de reflexão e debate mensal, percorrendo as quatro freguesias do interior. Após a primeira reunião na Nave do Barão reunimos em Alte e no passado sábado nas Barrosas (Salir) e estão em preparação novos encontros em Quereça e no Ameixial.

Temos identificado problemas novos e velhos e procuramos identificar respostas que tragam mais dignidade, mais esperança às pessoas que aqui vivem e a quem desejar escolher estes territórios para visitar, viver e trabalhar.

A diversidade de experiências e de perspectivas, a persistência e a vontade de contribuir para as mudanças desta triste realidade são a maior riqueza desta caminhada coletiva que procura ser pessoalmente gratificante e socialmente útil. Como tão bem escreveu Sebastião da Gama , PELO SONHO É QUE VAMOS....

Comovidos e mudos.
Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não frutos,
Pelo Sonho é que vamos.

IMAGEM DO MOMENTO EM PLENÁRIO NA ASSOCIAÇÃO CULTURAL DAS BARROSAS

Basta a fé no que temos.
Basta a esperança naquilo
Que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
Com a mesma alegria,
Ao que desconhecemos
E ao que é do dia-a-dia.

Chegamos? Não chegamos?